Essa é uma questão muito relevante em qualquer desencarne. É baseado nela que a recepção do desencarnado no mundo espiritual pode ser acolhedora ou decepcionante para ele. Aqui não estão envolvidos rótulos doutrinários que nada valem nessa circunstância. Ser espírita, católico protestante ou budista em nada altera a soberania dessa lei.
Ninguém perguntará, portanto, qual a sua religião, mas sim o bem que fez ou deixou de fazer. Para bem entendermos essa questão do mérito convoquemos Blaise Pascal, em seu excelente texto A verdadeira propriedade, inserido em O evangelho segundo o espiritismo, capítulo 16:
Ao viajante que chega a uma estalagem, se ele pode pagar, é dado um bom alojamento; ao que pode menos, é dado um pior; e ao que nada tem, é deixado ao relento. Assim acontece com o homem, quando chega ao mundo dos Espíritos: sua posição depende de suas posses, com a diferença de que não pode pagar em ouro. Não se lhe perguntará: Quanto tínheis na Terra? Que posição ocupáveis? Éreis príncipe ou operário? Mas lhe será perguntado: O que trazeis? Não será computado o valor de seus bens, nem dos seus títulos, mas serão contadas as suas virtudes, e nesse cálculo o operário talvez seja considerado mais rico do que o príncipe.
Em vão alegará o homem que, antes de partir, pagou em ouro a sua entrada no céu, pois terá como resposta: as posições daqui não são compradas, mas ganhas pela prática do bem; com o dinheiro podeis comprar terras, casas, palácios; mas aqui só valem as qualidades do coração. Sois rico dessas qualidades? Então, sejas bem-vindo, e teu é o primeiro lugar, onde todas as venturas vos esperam. Sois pobre? Ide para o último, onde sereis tratado na razão de vossas posses.
Como o texto é de uma clareza estelar estendamos o tema, mérito, para os suicidas, buscando na literatura espírita exemplos que confirmem essa tese.
André Luiz, Bezerra de Menezes e o suicídio
André Luiz, em seu livro, Missionários da luz, psicografia de Chico Xavier, cita-nos o caso de Raul, que havendo praticado o suicídio, dissimulando-o sob a farsa de um assassinato, ficou jogado sobre poça de sangue, quando um bando composto por dezenas de espíritos delinquentes, dele abusou, vampirizando-lhe os fluidos vitais, deslocando-o para outros sítios, efetuando-se o resgate quando as condições favoreciam o êxito da empreitada. Por sua vez, Bezerra de Menezes, no livro Dramas da obsessão, psicografia de Yvonne Pereira, narrando um caso de obsessão de desfecho suicida, descreve o local onde houvera dois suicídios, estando os dois espíritos ainda no local da tragédia. Um deles vagava a bradar por socorro, pois despedaçara o crânio com um tiro. O outro permanecia desmaiado, em coma, devido o choque brutal do envenenamento, ocorrido há mais de dez meses.
Já o louco que se mata, não sabe o que faz. Certamente dele não será cobrado o mesmo tratamento que o exigido de alguém lúcido. Cada pessoa tem sua história de vida, sua condição evolutiva, seus méritos e deméritos. O que nos autoriza dizer que não existe uma fórmula única para julgar o gesto malfadado de alguém. O mais correto é dizer que cada um será julgado segundo suas obras mais o acréscimo da misericórdia divina, sempre presente nas dores do mundo.
Atenuante e agravante
Daí a César o que é de César. Ou seja, a cada um seja dado o que lhe é devido. Significa que não podemos tratar a todos igualmente como prega a doutrina do igualitarismo. Quando tratamos pessoas diferentes do mesmo modo, estamos cometendo injustiça com alguém. Por isso na questão do mérito estão sempre presentes o atenuante e o agravante. Aqui o contexto é analisado minuciosamente.
O homem que está sendo torturado para que se lhe arranque uma revelação que oculta, não suportando a dor pode se matar; prisioneiros de guerra tomavam cianureto para não revelarem segredos de sua pátria; um doente terminal em dor lancinante pode cair na tentação de abreviar a vida. São muitas as motivações para que alguém se mate. Não nos cabe julgar, apenas lamentar que ainda exista na Terra acontecimento tão brutal.
Estratégias de superação
As leis de Deus não julgam, inocentam ou condenam alguém, pois são impessoais. Os erros que cometemos são consequências da nossa incapacidade de gerir o destino naquele momento, pois Deus considera que em nossa pequenez somos mais ignorantes do que maus. Mas nossos erros nos levam a criar estratégias de superação que nos encaminham ao reequilíbrio. Por isso, pedagogicamente podemos considerar o erro como uma tentativa de acerto. Desse modo, cada um se corrige, uma vez que o julgamento se dá pela própria criatura, mediante as leis da consciência. Não há punição, mas autocorreção ou retificação. Nessa caminhada, os bons espíritos, quais experientes professores, em obediência e em sintonia com a misericórdia divina, incentivam os retardatários à pratica do Bem para que lhes sejam acrescentados méritos.
Trabalhemos por nossa evolução espiritual no limite das forças a fim de que Deus, que a tudo assiste e a tudo abastece, nos torne plenos os caminhos que haveremos de percorrer. Que jamais percamos a coragem de amar, pois é na companhia do amor que haveremos de per‑ correr a extensa escadaria da evolução rumo às moradas felizes.
LUIZ GONZAGA PINHEIRO em Suicídio: a falência da razão (adaptado)
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