A pandemia de coronavírus trouxe mais reflexões sobre a morte, de acordo com uma pesquisa realizada pela agetech (startup do setor de longevidade) Janno em parceria com a empresa de pesquisa MindMiners.
Encerrando esta série especial, em que autores da EME analisam o tema na ótica doutrinária, Donizete Pinheiro, que escreveu, entre outros, A morte sem mistérios, fala sobre como deve ser nosso preparo para este momento comum a todos.
Recente artigo publicado no jornal O Estadão (02.06.20) traz questões relacionadas com a morte, nestes tempos de pandemia, por causa do coronavírus.
Começa pela afirmação de que a morte é considerada um tabu para 7 em cada 10 brasileiros.
Com efeito, não só os brasileiros, mas o ser humano em geral não gosta nem de falar sobre a morte e muito menos se prepara para ela.
Para alguns é o fim de tudo. Para outros, o que vem depois é incerto: um céu, um inferno, um sono indefinido, a integração num todo indefinível…
Mala pronta
As incertezas quanto ao além e a possibilidade de deixar de existir assustam a criatura, que então prefere ignorar a morte, embora seja a única coisa certa na Terra: todos vamos morrer, mais cedo ou mais tarde, de um jeito ou de outro. A morte é um fato natural da vida.
Questões importantes para os familiares que ficam são desprezadas, como a documentação em ordem, situação financeira ajustada e eventual seguro de vida e partilha de bens. Esse o eixo central do articulista, uma abordagem eminentemente materialista, por considerar a finitude da vida.
É certo que não podemos mesmo desprezar a prudência, porque a morte causa não só a dor pela perda, mas igualmente pode acrescentar sofrimento em razão de eventuais dificuldades econômicas não devidamente resolvidas, especialmente quando quem parte é o responsável maior pela família.
As ocorrências desta pandemia, como de resto em qualquer outra situação, mostram que a morte pode chegar inesperadamente. Então, a pessoa sensata não irá esperar uma incerta velhice para pensar e se organizar para a morte. É preciso estar com a mala pronta.
Deixar a família com a situação financeira e social equilibrada é também uma manifestação de amor. Afinal, vivemos num mundo em que morar, comer, se vestir, estudar, ter saúde e lazer fazem parte do bem-estar da pessoa.
Valor relativo
Contudo, a morte não é o fim. Somos espíritos imortais tendo agora uma experiência na matéria. Embora a vida seja única e infinita, reencarnamos em corpos físicos diversas vezes, até alcançarmos a pureza espiritual.
Foram os próprios espíritos – as almas daqueles que já morreram – que retornaram pela mediunidade para nos contar a esse respeito. E são tantas as narrativas, por médiuns seguros e honestos, que disso não se pode duvidar. Aliás, nenhum sentido teria a existência, com todas as suas discrepâncias e desigualdades, se tudo terminasse no túmulo. Deus não seria nem perfeito, nem justo e amoroso.
Assim, nós espíritas temos a certeza de que viemos do plano espiritual e para ele retornaremos pelo fenômeno que chamamos de morte: a incapacidade do corpo de manter a vida. Com a morte, iniciamos o processo da desencarnação, que é a liberação do espírito do corpo morto.
Essa realidade sobreleva em nossas vidas. Nossa estada no planeta tem por finalidade o desenvolvimento das nossas virtudes e nos conduzir à felicidade plena, que ainda não é deste mundo.
Isso significa que, se devemos valorizar as coisas, esse valor é relativo e não deve preponderar sobre o aprimoramento das qualidades da alma.
Por isso, a nossa maior preocupação nesta Terra abençoada é o nosso aperfeiçoamento intelectual e moral e daqueles que estão sob a nossa tutela e amizade. Muitos se preocupam em garantir aos familiares os recursos materiais necessários e não se lembram do preparo para a vida moral, religiosa, espiritual.
Um preparo permanente
O preparo para a morte deve ser permanente, consistindo em viver bem. Cada dia é bendita oportunidade a ser aproveitada para o cultivo dos valores da alma, pela prática da lei de amor, justiça e caridade.
Necessário cultivar o desapego dos bens e das ocupações terrena; e manter o equilíbrio afetivo nas nossas relações pessoais, sem nos tornarmos dependentes afetivos uns dos outros.
No caso da desencarnação da jovem Cremilda, narrado por André Luiz no livro Os Mensageiros (cap. 48), psicografado por Francisco Cândido Xavier, o mentor Aniceto esclarece que a moça enfrentava o pavor da morte, porque, embora portadora de uma bondade natural, não havia se preparado na educação religiosa dos pensamentos, não tinha preparação espiritual.
Há, por força do instinto de conservação, um medo natural da morte. Mas o conhecimento da realidade pós-morte – como nos oferece o espiritismo – e a fé em Deus evitam que ele se transforme num exagerado temor, que nos impeça de manter serenidade quando do inevitável momento. Se não devemos desejar a morte e antecipá-la, também não devemos nos desesperar e revoltar quando chegar o seu tempo, até porque pode significar a libertação de provas e sofrimentos aqui experimentados.
Partida e chegada
A morte será sempre uma experiência pessoal, ainda que se dê em circunstâncias coletivas, como a que se vê em catástrofes da natureza, em guerras, em grandes acidentes, incluindo-se aí a pandemia que estamos vivenciando na atualidade.
Cada espírito, pela sua conduta moral, inferior ou superior, experimentará uma desencarnação em piores ou melhores condições, com maior ou menor perturbação, sob o guante de inimigos ou com o amparo de amores ou de socorristas, restrito a zonas de sofrimento ou confortado em esferas mais elevadas.
Dentre as religiões ou filosofias, é a doutrina espírita que nos oferece uma imensa quantidade de informações sobre a situação do espírito no momento da morte e na desencarnação, sobre o seu destino após esta experiência carnal, de modo a permitir que desde logo nos preparemos para viver de tal forma fazendo o bem que a nossa partida e a chegada no Além possa se dar com a consciência tranquila e com a feliz gratidão de todos.
DONIZETE PINHEIRO é juiz de direito aposentado e escritor com diversos livros publicados pela Editora EME